quinta-feira, 11 de março de 2010

Tempo e dinheiro.
Com ou sem acento, é uma questão simples. Tem gente que crê que tempo é dinheiro.
O Comandante de minha Unidade perguntou-me como estava minha vida de solteiro. Respondi, decerto irrefletidamente, que as mulheres de meu tempo são diferentes das que estava acostumado a lidar. A vida de divorciado pode ser boa, na medida de que em tais condições perdem-se os grandes receios da vida. É mais fácil decidir coisas difíceis quando não há “interferência” no nosso decidir. Quando casado, havia sempre a preocupação de evitar os dissabores de explicar à cara metade uma série de problemas, inclusive a possibilidade de passar alguns dias “guardado” na Unidade. A vida de sargento casado muitas vezes é inferno e paraíso, num paradoxo que certamente repercute em nossas vidas profissionais.
Noutras vezes há certa graça que se eu pudesse, compartilhava com todo o efetivo. Quem vai dizer que nunca teve vontade de fazer valer a realidade do que você deseja às pessoas com que se convive? Fazer a diferença é um dos objetivos que se acredita mais nobre em qualquer ser humano.
Pouca coisa é mais gratificante – e motivante – que a aplicação completa de todo o potencial pessoal. Quando penso no assunto, é porque muitas vezes observo as diferenças no árido terreno da cadeia de comando. Relaxemos. Nada do que há de ser escrito que possa ferir regulamentos. Não mais do que costuma acontecer em decorrência de nossas omissões.
É questão de se registrar, antes que se perca a oportunidade e propriedade, que dos quartéis saem os brasileiros mais disciplinados. Se é que é possível discernir disciplina e acatação sem confundi-la com a aceitação irrefletida dos constantes abusos aos quais muitas vezes é submetido o funcionalismo público, quer na esfera civil ou militar. O ponto positivo de um quartel é a rotina. Permite que o indivíduo se organize e se concentre. Arte da vida de quartel.
Por outro lado, o ambiente de rotina faz com que o ser humano perca um pouco da criatividade característica do meio civil. Quando aparece um problema no funcionamento no seio militar, sempre é um caso novo que deve ser pesquisado. Com iniciativa regulamentar às competências é muito comum que ninguém tome posição alguma. Trata-se de um limbo orientativo que se agrava nas forças militares desde a transição de governo iniciada com Ernesto Geisel para as mãos da sociedade civil. A maior parte dos dispositivos implantados pelos militares como forma de contenção do interesse escuso privado no poder público já não subsiste.
Cinco presidentes militares foram suficientes para iniciar a ratificação da meritocracia. Como na vida castrense, qualquer grupo depende da existência e preparo de pessoas que orientem-se à formação de um grupo coeso para a obtenção de objetivos de grupos ou instituições. Gente que saiba exatamente o que se passa e o que fazer.
O que em outras palavras significa agregar potenciais.
Admito assistir poucos programas televisivos.Talvez herança de uma geração que acreditava que a mesma resulta em alienação, o fato é que costumo escolher com objetividade meus canais. Canais abertos foram abolidos há alguns anos de minha residência, substituídos por um canal onde é apresentado um programa do universo empresarial chamado ManagemenTV, que é bastante interessante. Conforme aplico alguns conceitos que desejo à Sala Telegráfica, obtenho resultados impressionantes. Faço-o porque dependo de meus colegas de trabalho para que possamos dar vazão ao fluxo operacional e administrativo violento no caso de queda de nossos sistemas de segurança – essencialmente digitais. Sempre será necessário disponibilidade de grupos de comunicação eficazes o suficiente para transmitir mensagens tão rápido como era feito quando ainda utilizavam-se telégrafos.
A disposição da doutrina militar vigente em décadas passadas faziam uso da distribuição hierarquizada de pessoas consubstanciadas às necessidades do Estado. Com o advento do avanço tecnológico de meios, essa cultura perdeu-se entre redes e servidores, numa falsa crença que tudo o que é necessário para a segurança de um país deva-se sobremaneira à tecnologia de informação. Fosse a afirmação verdadeira, não haveria como explicar o insucesso de qualquer país em empreitadas militares na comunidade árabe. Toda tecnologia de combate propagandeada pela CNN na guerra do golfo não eclipsa o fato de ter falhado, em variados escopos, o embate bélico. Por pessoas comuns, sem redes de comunicação desenvolvidas, com velhas AK-47. O natural espírito aguerrido do árabe sugere sua superioridade aos seus eventuais invasores.
Constato constantemente que o Brasil estava mais seguro quando havia telegrafistas militares. Quando a comunicação operacional e administrativa passava obrigatoriamente por equipes de serviço. Era mais difícil combinar desordem. Quando o explico para as pessoas, muitas apresentam tendência de crer que desejo o retorno de máquinas telex ou manipuladores às posições operacionais das atualmente capengas salas telegráficas da Força Aérea. Não é nada disso. É uma questão conceitual:
É mais difícil transpor homens que máquinas. Você pode pular uma catraca, driblar uma fechadura eletrônica, contornar o caminho de um tanque de guerra. Não pode contornar um sentinela atento e armado.
Trata-se da crítica natural de um militar – e militante sentinela – que assiste efeitos dos embates externos e faz análise própria dos fatos. Na maioria das guerras modernas há de se atentar ao fato que tecnologia não tem poder de ocupação. Gente tem o poder de ocupação, o que devolve ao elemento humano a habilidade de organização para consecução dos objetivos de sua nação. Para o militar médio é difícil ver com bons olhos a disposição com que sistemas distintos apóiam-se de forma dependente da rede Intraer, por exemplo. Companheiros mais antigos manifestam timidamente algum grau de preocupação que, mesmo considerando pouco específico meu conhecimento em redes digitais, acredito procedentes.
Faltou Luz. Quanto dura a bateria? 2214P
A luz voltou em cerca de quinze minutos. Quinze minutos sem recurso energético. Não dava para tomar banho, nem para passar a farda. Tempo perdido. Interrupção de rotina.
Quando a gente consegue tempo para pensar com mais calma, consegue sintetizar o dia. Proponho-me às vezes um esforço adicional para tecer minhas próprias anotações, madrugada adentro. As de cunho geral são mantidas no computador. As de cunho pessoal, em minha consciência. Às vezes, o que chamo consciência resume-se à simples idéia de continuidade da memória, ou seja: se aprender nada mais é do que lembrar o que já se sabe. Viver é aprender a conectar o ontem com o hoje.
Enquanto a gente aprende, é comum esquecer de fazer o registro. Minha própria experiência como estudante mostrou-me mais propenso a anotar o mínimo possível, mantendo o máximo de informação disponível em minha própria mente. Meus professores, num esforço de incentivar o desenvolvimento do raciocínio, insistiam para que não adquiríssemos o hábito de utilizar uma calculadora ou recorrer ao dicionário para verificar a ortografia de palavras de médio entendimento. Lápis com tabuada? Crime punível mesmo pela professora de português.
Tudo isso num colégio público, que decerto é sorte estar instalado na quadra de “primeirões” e “subões” da Aeronáutica. É necessário explicar a relevância do exposto:
Concorrência.
O colégio público instalado na SQS 214 acolhia a maior parte os filhos dos militares “de tropa”. Os filhos dos que não gostam de viajar – e portanto não se locupetam com diárias. Trocam viagens de ouro para estar mais próximos aos filhos e esposas. Naquele tempo, isso significava a impossibilidade de investimento no ensino particular. E a rede pública estava ali, perto de casa. Brasília de minha infância e adolescência foi “desenhada” assim.
Para os professores daquele colégio, a “unidade” em que trabalhavam era uma boca-pobre. Lidavam com os filhos de uns caras que sabiam exatamente como apertar um professor. Cobrá-lo para que deixassem seus filhos tão eficientes quanto eles mesmos o eram. Sinto que esse foi o pensamento de muitos, na época, enquanto seus filhos cresciam. Houve resultados. Grande parte de meus companheiros de aprendizado na referida escola encontram-se hoje em escalões diversos do governo. Aprendíamos que mesmo quando não há autoridade envolvida em suas ocupações, há um poder coletivo. Isso era transmitido, quase subversivamente, por nossos professores. Ensinavam que o controle de nossas vidas sociais dependia de modo intrínseco de nossas atitudes, gestos e moral.
Para os professores, errar a correção de uma prova era um inferno. Elas ensinavam um modo de resolver uma expressão, e o aluno não entendia. O pai ensinava a resolução de modo mais simples, e a professora não entendia. Dava meio certo na questão.
O pai ficava uma arara. Não iria perder um minuto de seu expediente para ensinar outro funcionário público do magistério. Na reunião de pais e mestres, havia professores humilhados em sequência, após entregar boletins de notas estratosféricas de garotos que em casa eram calmos, e na rua andavam perigosamente de bicicleta, acertavam automóveis durante jogos de “bete”, irritavam porteiros... e ainda passavam de ano! Reunião de pais e mestres eram aqueles encontros onde os mestres tinham que medir moral com os pais de crias aterrorizantes.
O resultado é que as aulas rendiam. Ao menos para os interessados.
Renderam tanto, que as criaturas aterrorizantes hoje estão, como foi dito, em diversas esferas do governo federal e estadual. Alguns são policiais civis, outros médicos. Uns policiais militares, outros militares do corpo de bombeiros.
De infância e adolescência, vários colegas empenham suas mentes e conhecimentos para irradiar o aprendizado das tardes e manhãs de um colégio civil, numa quadra militar. Na vontade de rever amigos, basta um passeio em quaisquer esferas do judiciário para saudar um ou outro velho conhecido. Tive um colega de classe na década de 90 que ia para o colégio “cumprir expediente”. Seu conhecimento genérico era superior à soma dos professores de nossa coordenação escolar, o que significava notas invariavelmente acima de 95 por cento. Jales prendeu japonês sozinho. Estimo que tenha deixado a Abin.
Como Jales, diversos de outros contemporâneos da idade escolar fazem expectativa de nossos desempenhos na vida adulta. Preparávamo-nos conscientemente para isso. Acreditávamos na verdade de que seríamos capazes de orientar parte do mundo à nossa volta, e fazer valer sonhos e desejos de nossos mestres e pais adquirindo-os como imagem única do destino que desejavam a seus netos. Isso faz-se presente quando extraímos impressões de nossos dias e prospectamos o futuro de nossos filhos. Sejam numerosos ou não.
Todos eles prestam atenção em como lidamos com nossa autoridade, traduzida esta pela imposição da moral individual com que desempenhamos nosso papel familiar. Alguns, como creio meu caso, atentavam também com a lida social e profissional com a mesma orientação indicada no meio familiar. Moral pública por conseguinte era reflexo de criação.
Os grupos de poder oficiais são tidos pelos titulares das cadeiras definida popularmente por “autoridade”. Brasília é uma cidade com formalidades de Estado e reverências típicas de uma corte. Muitos de nossos agentes políticos de governos eleitos – que confundem a si mesmos por indivíduos de Estado – evoluem na nada transparente nuvem de relações indiretas que dão acesso aos recursos dos incontáveis gabinetes distribuídos na capital. Poucos deles demonstram cultura profunda no sentimento definido por nacionalista.
Curioso também o sentido inverso, quando gente que participa de poderes tipicamente de Estado imiscui-se com o segmento político. Trata-se de um acesso pouco conveniente para o interesse público tipicamente castrense, esse mau hábito de tratar a resultados perenes decisões típicas das incoerentes gestões governamentais. Dessa relação de negação a princípios castrenses, portanto imprópria à experiência dos governos militares alimenta-se o lobby, bem como a reprovável prática de favorecimentos pessoais típica de habitantes da capital do país. Se antes o lobby era tido por um inconveniente administrativo para os governos militares mais severos, trata-se hoje de uma endemia. Incomoda-me profundamente percebê-lo cada vez mais freqüentemente. Cada vez mais próximo das posições operacionais militares que me foram confiadas.
Tenho um ponto de vista particular acerca de diversos assuntos pouco abordados pela maior parte das pessoas. Percebi também que há poucas pessoas que têm a habilidade de realizar atividades desagradáveis por mais desmotivadoras se tornem, contanto que acreditem na missão desempenhada. Desenvolvi essa capacidade por convivência no serviço militar. O gosto pela tenacidade de testar o organismo – e o ânimo – até o limite que se deseja que os demais o façam poucas vezes é desenvolvido voluntariamente. É outorgado pela necessidade do serviço.
Já tolerei escalas apertadas, escalas folgadas. Chefias ausentes, chefias problemáticas. Boas equipes, e colegas depressivos... sem a menor motivação pessoal para fazê-lo, a não ser colaborar com meus próprios convivas. No universo inverso à vida soberba dos gabinetes de governo, reconheço e atesto o valor de grupos de pessoas que assumem o serviço armado de suas unidades, complementam escalas diuturnas e ainda assim permanecem com espíritos quase sempre solícitos. Aplicam de tal modo o tempo de suas vidas a viver dentro de quartéis a ponto de ignorar que o mundo evolui lá fora, logo após a guarda. E é estupidez acreditar que se está seguro porque está dentro de um quartel. Isso nunca foi verdade.
A verdade é que os inúmeros sistemas de convocação, mobilização ou qualquer nome que se dê em casos típicos de um acionamento, nunca foram testados em conjunto, de modo saber de que modo o efetivo militar das forças militares se comportariam no conjunto, em caso de hostilidades externas. Principalmente se for considerado a inaptidão natural de nossos graduados na iniciativa de conter abusos em qualquer nível. Isso me irrita pessoalmente.
Isso porque não me considero o que desejaria ser. E realmente acredito que muitos de meus pares não têm a menor aptidão de tornarem-se muito mais eficientes que eu. Isso significa que estamos aquém do desejável. Todos nós.
Oficiais generais, superiores, intermediários ou graduados não apresentam no todo um grupo que eu qualificaria capaz de cumprir com nossas obrigações militares a contento no caso de hostilidades. Aproveito esse particular para expressar a pachorra pessoal afirmando que falta nos quartéis, em menor escala que no mundo civil, Moral. Com “M” maiúsculo.
Se entendi bem, moral é a constante aplicação da ética. Compreendendo por ética o que é bom para o indivíduo e a sociedade, muitas decisões a que se presencia negam o bem comum, excluindo-se da ética. Difícil caracterização que caracteriza abuso.
Produzir efeitos em homens, quando na cadeia de comando, significa utilizar um de dois dispositivos: a prerrogativa da competência e autoridade, ou a moral coercitiva. Chefia ou liderança.
É isso o que acredito que signifique honrar a farda. Saber lidar com a missão de cada força por uma ciência ou uma arte.

Creio que a cada brasileiro que é dado a autoridade de responder por integrante de uma força armada, a responsabilidade de realizar suas funções do modo que lhe pareça mais interessante, no prazo da vida útil do militar, de duração atual de 30 anos de serviço. A partir daí, essa “vaga de combatente” passa para seu substituto, que deverá primar em transmitir seu cargo com a mesma lisura que recebeu de seu antecessor.
Qualquer violação nesse dispositivo torna o indivíduo passivo de punição por atentar contra sua instituição ou costume. Mas há quem o arrisque.
Ocorreu-me identificar esses e outros empecilhos ao desempenho de nossas funções legais e permitir-me criar dispositivos para estudá-los, classificá-los, coibi-los dentro de nossas leis e regulamentos.
Enquadrá-los.
E vejo que a vida tem colaborado, determinando as atividades. Observo constantemente as necessidades de minha Força, e atento a formas de supri-las. Vejo que falta muito para que possa crer no potencial de nosso efetivo. Trabalhamos abaixo dos mínimos operacionais, tanto no campo pessoal como no profissional.
E ainda assim subsistimos em funcionamento.
No escopo que interessa informar a qualquer pessoa, há muito o que ser feito enquanto a estrutura não se desequilibre como conseqüência natural de ações particulares. Não tenho observado muitos exemplos de uma dedicação sincera, digna do empenho do esforço dos integrantes de minha Força. Em outras palavras, falta verdadeiros voluntários. Ruim não é estar pesarosamente consciente destes fatos e deixar-se aborrecer intimamente.
Ruim é nada fazer, por isso tento realizar algo a respeito, na medida que seja permitido todo dia.
A vida de comunicações é retransmitir de modo ordenado informações recebidas. Algumas a gente mantém como impressão pessoal, outras a gente simplesmente retransmite. Oficialmente, nada saber e esquecer o que lembrasse porta adentro do quartel. Essa é a regra e paradoxo básico.
Meu “proceder” é o mesmo dos antigos: manifestar-se quando a situação o exigir. Por isso escrevo pouco ou quase nada no livro de ocorrências de meus postos. Para que quando o faça, a vontade do Comandante da Guarda seja devidamente atendida. De presto, porque será cobrado mais tarde. Ninguém gosta de ser cobrado por seus subordinados. Nem eu.
E eles cobram. Cobram com o olhar quando permito que gente de moral duvidosa cause mal ao nosso funcionamento cotidiano. Soldados vêem cabos e sargentos que também foram soldados uma espécie de referência. Imponho constantemente à minha própria subsidiar essa referência para suas vidas civis. Ensino-os a evitar as panes. Ultimamente, dado a quantidade de problemas interpessoais que se perpetram nos quartéis, obrigo-me a deixar a explicação e abreviar a situação: ensino-os eventualmente a se defender. O conceito de defesa para o militar antigo da Proteção ao Vôo é extremamente mais complexo que a de qualquer profissão civil. Defesa jurídica. Procedimentos e dispositivos administrativos que asseguram que o que é relatado, reportado ou registrado – mesmo em um livro de memórias – não os conduza a uma cadeia disciplinar. Ao contrário, conduza à solução apropriada os setores pertinentes. Assim trabalha tradicionalmente o Operador de Comunicações Militares.
Para que eu possa escrever com essa desenvoltura em meu próprio laptop uso uma série de “filtros” pessoais. Isso assegura que o que vem à mente não seja “xeretado” eletronicamente. A barreira não é digital, não é física. É jurídica.
E recomendaria que outros brasileiros passassem a utilizar algumas dessas técnicas, as quais tenho a intenção oportuna de organizar.
Como escrever e explicar essa série de procedimentos sem ser submetido à avaliação psiquiátrica por algum alienado social qualquer, conforme já ocorreu com minha pessoa, é que é a arte. Um profissional militar de comunicações deve saber fazê-lo com precisão.
Para começar, o sigilo das comunicações é somente jurídico. Qualquer pessoa pode grampear um computador à distância como o é possível a um celular.
Logo, tudo o que é conversado, escrito ou codificado é passível de interceptação. Essa paranóia não é minha, é dos profissionais da Tecnologia da Informação. Essa turminha era doida para ter acesso às comunicações militares. Principalmente após o regime militar.
Lembro sempre que o trauma não é meu: é do cidadão comum. Nasci confortavelmente do lado de cá do prende, bate e arrebenta. Filhos da geração coca-cola.




Quando dedico algum tempo para registrar minhas impressões, quase sempre toma meu espírito a vontade de reagir com violência. Há vários tipos de violência, todo militar sabe muito bem isso. Militares de minha classe eventualmente a estudam.
Há a violência física. A desmobilização do inimigo pelo abatimento físico. O oponente torna-se organicamente incapaz de reagir com energia. Isso ainda não determina a vitória. O inimigo ainda pode se reerguer. Basta recursos.
A violência física tem origem nos pequenos embates quando criança. Quando as mais mimadas – e detestáveis – crianças choram para ter o que querem dos pais. Tentam fazê-lo com seus professores e muitas vezes conseguem sucesso, com a intervenção dos pais. Logo após, passam a chorar para seus coleguinhas, e vendo-os rindo, aproveita seu tamanho agigantado e partem para agressão física. Crianças que desenvolvem ração
Tem também a violência espiritual. Aquela em que o moral do oponente é afetado ao ponto de interiorizá-lo em definitivo. Torna-se um inimigo fraco de reação por omissão de sua própria vontade. O inimigo ainda pode reerguer-se, aliando-se ao que crê possível realizar e seus pares que pensem de mesmo modo. Um grupo vence quase todo oponente. O homem de fé sempre é um oponente que responde por vários, esse é o êxito dos “bons”, em toda extensão do termo. Homens ruins desagregam-se com facilidade.
‘ A violência moral se dá quando se ignora os limites da autoridade. Não o li em lugar nenhum, mas é constatável: uma das partes encontra-se amparada e é preterida dos interesses a que não negariam a ninguém. Isso ocorre quando um país invade outro “porque somos maiores e em maior número”, e também quando o superior ordena algo que visivelmente não é do interesse do serviço, mas agrada-o pessoalmente.
Contenho meu prazer em informar ter aprendido a utilizar as ferramentas disponíveis para a maior parte dos problemas do efetivo. E a solução vem do próprio efetivo, é o que leva a crer.
A relevância do que me presto a ocupar meus momentos de folga a compor essa redação é sentir-me verdadeiramente “de corpo presente”. Tomar as iniciativas que as pessoas que me cercam têm por desejo que alguém o faça.
Não busco glória, não me apraz valor. Também não tenho por objetivo participar do já instalado desassossego público. É transmitir parte do necessário para que pessoas passem a perceber, valorizar e respeitar cada militar que veste azul. Busco justificar meus companheiros. Afinal de contas, não creio que estejamos fazendo nosso melhor. Podemos fazer muito mais.
Lendo um livro de Jorge Motta, ex-secretário da Casa Civil do Distrito Federal, qualquer brasiliense é capaz de se identificar com seu estilo leve, explicativo de citar fatos e situações que determinaram a disposição geográfica de Brasília, e sua eficiência como cidade residência ao comando estatal do país Brasil.
Percebi que por mais complexas tenham sido as relações das pessoas às voltas do poder na década de 70, pôde-se esclarecer com certa ternura o clima de época, que alimentava as decisões de pessoas que criaram Brasília, minha cidade.
É estranha a sensação que me toma escrever o termo “minha cidade”. Muitas vezes pesa definir se a cidade é nossa – os cidadãos, ou somos nós quem pertence a ela. O que é possível sentir, quase palpável é o fato que há uma ligação muito forte entre Brasília e os que aqui habitam. Uma relação de amor e ódio, onde é possível admirar o respeito pela travessia de um pedestre à faixa com a mesma freqüência de delitos. A capacidade de relevar as imperfeições sociais quase sempre é originada na própria paciência que temos com nossos familiares. Relevar a impaciência da esposa, algumas atitudes dos filhos, tudo isso muito se assemelha da atitude que um cidadão radicado na cidade assume em relação ao que também não o agrada ao sair à rua.
Agora, mais de quinze anos depois de ser convocado “no laço”, sinto-me como uma bomba, pronta a explodir um período de reflexões. Percebo-me mesmo, capaz de dar ao efetivo recursos para que façam uso da legislação vigente, e passem a fazer parte das decisões de iniciativa presumida das autoridades. Usar o poder coercitivo do pleito da tropa. Necessidade do serviço. Tudo isso é possível resumir:
Aprendam a apertar autoridades.

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